domingo, 3 de junho de 2012

Nordeste - terra de bravos


O velho cordel Nordeste - terra de bravos, escrito em 1993 e arrolado na antologia de poemas Até onde nós iremos?, foi publicado pela editora  Luzeiro em 2006. Pois bem, neste momento, o folheto está no topo da lista dos mais vendidos do site Magazine Gibi, coordenado por Wanderson Nicoló, entre os livretos de 16 páginas. Na lista geral, ocupa o quarto lugar. 

O segundo da lista é Os apuros de Chicó e a astúcia de João Grilo,  embrião do Presepadas de Chicó e astúcias de João Grilo. No caso do primeiro, o texto é de um autor em formação (o que continuarei sendo até o dia em que fechar os olhos). 

Eis o início do folheto Nordeste - terra de bravos com a métrica mais ajustada:


Nesse  poema eu abordo
Nossa região Nordeste,
Onde a seca se abateu,
Onde predomina a peste,
Onde clamam todo o dia
Por uma ajuda celeste.

Onde o Sol lança na terra
Os seus reflexos de ouro,
Onde as grandes tradições
São magnífico tesouro,
E a poesia do povo
É um dom imorredouro.

Onde o povo ainda crê
Nos poderes do Destino,
E os caminhos são traçados
Pelas mãos do Rei Divino,
Onde em tempos mais difíceis
Reinava Antônio Silvino.

Onde com fé e esperança,
Sempre uma multidão,
Em Juazeiro do Norte,
Em busca de redenção,
Venera a figura imensa
Do padre Cícero Romão.

Onde em Bom Jesus da Lapa,
Guiados por uma luz,
A cada ano, os romeiros,
Carregando imensa cruz,
Buscando dias melhores,
Rezam para o Bom Jesus.

Nordeste dos peregrinos
Do sertão do Canindé,
Dos que superam distâncias
Com o combustível da fé,
Rogando a intercessão
Da Virgem de Nazaré.

Onde as vozes mais ilustres
Cantam a degradação,
Para nós são como lustres
Iluminando a amplidão:
A poética de Cabral,
O canto de Gonzagão.

Onde os filhos de Zumbi
Semearam consciência,
E ainda seguem lutando
Em prol da independência,
Contrapondo à tirania
A heroica resistência.

Nordeste — terra de bravos —
Que presenciou um dia
Leandro Gomes de Barros
Semeando poesia,
Cego Aderaldo empunhando
O cetro da cantoria.

Onde os engenhos morreram
Sufocados pela usina,
Onde os vaqueiros valentes,
Sem temer a dura sina,
São guiados pela luz
Do raio da silibrina.

Nordeste, que viu nascer
Inácio da Catingueira,
Gulino do Sabugi
E Romano do Teixeira,
Nordeste do Cariri,
Da gente forte e altaneira.

Terra que assistiu ao voo
Do Pavão Misterioso,
Ao canto da Asa Branca,
À saga do Boi Barroso,
À marcha de Carlos Prestes
Do esquadrão revoltoso.

Nordeste dos coronéis
Cretinos, vis, ordinários,
Dos políticos corruptos,
Patifes e salafrários,
Vereadores pelegos,
Que se vendem por salários.

Onde beleza e injustiça
Convivem no mesmo chão,
Onde um dia foi temido
O rifle de Lampião,
Que foi, depois de Silvino,
Governandor do sertão.

Onde ainda existem marcas
Da vingança de Corisco,
Onde os ribeirinhos temem
O Compadre d’Água arisco,
Que chora ao ver degradado
Nosso rio São Francisco.

Onde a família Batista
Na poesia é imortal,
Eternizando a disputa
De Pinto com Lourival.
Onde, nas encruzilhadas,
Duelam o bem e o mal.

Gigantesca região
De lendas e contos mil,
Terra de vultos ilustres
Na História do Brasil,
Perseguida pela fome
E pela miséria vil.

Lugar onde “o sertanejo
É, antes de tudo, um forte”,
Já disse Euclides da Cunha,
Elogiando o porte
De um povo que só se curva
À face horrível da morte.

No Nordeste, as terras férteis
São motivo de disputa,
O latifúndio domina
Como força absoluta;
Não há a reforma agrária,
Gerando desigual luta.

Nas regiões produtivas,
Como no sul da Bahia,
É o labor da gente humilde
Usado com tirania —
Trabalham como escravos
Por uma ínfima quantia.

Contudo, há outras áreas
Com o chão estorricado,
Onde o povo pobre carpe
O seu fadário pesado —
Sem abandonar a fé,
Mas por ela abandonado.

Porque aqueles que moram
No desprezado sertão
Esperam que a chuva venha
Pra cultivar o seu chão —
E só na última instância
Abandonam seu torrão.

A terra vermelha em brasa
É uma mórbida paisagem,
E caveiras de animais
São o símbolo da coragem
Dos que sonham com um futuro
Com mais bonita paisagem.

(...)

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